Como funciona o vício em álcool e drogas?
Dentre os vícios mais comuns, está a dependência química, especialmente a que se refere a álcool e drogas. Onde está o limite entre uso e vício? Veja os principais indícios de um problema.
Quando falamos de álcool e drogas, tema que envolve dependência e inúmeros malefícios, parece ser de conhecimento de todos. Porém, as estatísticas demonstram que a dependência química continua estando ligada a grande parte da população, e vinculada a altas taxas de mortalidade no país. A psicóloga Maitê Hammoud convida à discussão.
Recentemente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou um estudo no qual foi identificado que 55% dos jovens do ensino fundamental e médio já ingeriram bebidas alcoólicas. Outro dado importante consta em estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS): cerca de 80.000 óbitos no Brasil foram atribuídos ao consumo excessivo de álcool, principalmente nos casos de morte por problemas hepáticos.
Além disso, pesquisadores afirmam que quase 6% dos brasileiros são dependentes de drogas. Vale lembrar que, quando falamos de dependência química, estamos falando de toda e qualquer substância que cause dependência física ou psíquica, onde podemos citar como as principais:
- álcool,
- maconha,
- crack,
- LDS,
- ecstasy,
- alucinógenos,
- inalantes,
- anfetaminas,
- cocaína,
- tabaco.
O que leva ao vício?
Segundo a OMS, a dependência química é caracterizada pelo estado psíquico (e algumas vezes físico) resultante da interação entre um organismo vivo e uma substância. É caracterizado por modificações de comportamento e outras reações que sempre incluem o impulso a utilizar a substância de modo contínuo ou de forma periódica, com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos e, algumas vezes, de evitar o desconforto da privação.
Os graus de dependência variam entre leve, moderado e grave, mas, independentemente de grau ou da substância em questão, todas as drogas que são consumidas em excesso têm em comum a ativação direta do sistema de recompensa do cérebro, o qual está envolvido no reforço de comportamentos e na produção de memórias. Como norma, as drogas ativam diretamente as vias de recompensa, que costumam produzir sensações de prazer.
Além disso, pessoas com baixo nível de autocontrole, o que pode ser reflexo de deficiências nos mecanismos cerebrais de inibição, podem ser particularmente predispostas a desenvolver transtornos de vícios desse tipo de substância. Isso sugere que, em alguns casos, a origem dos problemas pode ser observada nos comportamentos da pessoa muito antes do início do uso habitual da substância.
Indícios de uma dependência
São vários os indicativos de que você pode estar se tornando um dependente:
- baixo controle sob o uso da substância;
- expressar desejos persistentes de reduzir ou regular o uso da substância, podendo revelar vários esforços malsucedidos para diminuir ou descontinuar o uso;
- gastar muito tempo para obter a substância, usá-la ou recuperar-se de seus efeitos;
- as atividades diárias começam a girar em torno da substância;
- desejo intenso de usar a droga a qualquer momento;
- mesmo que tenham sido percebidos problemas físicos ou psicológicos, o uso da substância não é abandonado;
- percebe-se uma tolerância do organismo, fazendo que o aumento das doses seja gradativo;
- sinais de abstinência que motivam o consumo da substância com fins da diminuição dos sintomas que ela provoca.
Podemos destacar também prejuízos sociais que indicam a existência de um quadro de dependência química:
- fracasso em cumprir obrigações no trabalho, escola ou no lar;
- continuar o uso da droga mesmo que resulte em prejuízos sociais ou interpessoais;
- atividades sociais, profissionais ou recreativas tendem a ser abandonadas;
- afastamento de atividades em família;
- o uso recorrente da substância expõe a pessoa a situações que envolvem risco à sua integridade física.
O consumo e a intoxicação que podem desencadear alterações no humor, julgamento e crítica prejudicados, perturbações na percepção, sono, atenção, pensamentos e comportamentos (psicomotor e interpessoais) podem trazer ainda inúmeros problemas de saúde, tais como cirrose, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), lesões neurológicas e, até mesmo, fazer com que a pessoa fique mais vulnerável a acidentes automobilísticos e à contração de doenças sexualmente transmissíveis como o HIV, já que a crítica está prejudicada e afeta suas decisões.
Tratamento do vício em álcool e drogas
Os vícios requerem apoio e acompanhamento multidisciplinar, e podem estar associados a depressão, transtornos de ansiedade e baixa autoestima, sendo fundamental o acompanhamento psiquiátrico e psicológico. Muitas vezes, demanda ainda a presença de um clínico e internação, na qual a pessoa será privada de qualquer estímulo que possa dificultar a desintoxicação e superação do vício.
O apoio dos familiares e grupos de autoajuda são fundamentais para que a pessoa sinta-se amparada e acolhida em suas dificuldades.
Algumas perguntas autorreflexivas podem auxiliar no entendimento e identificação da presença do vício.
Quando o assunto é álcool e drogas, você:
- alguma vez sentiu fissura ou forte desejo?
- alguma vez precisou usar mais álcool ou drogas para obter o efeito desejado?
- alguma vez sentiu que não poderia controlar o uso
- alguma vez sentiu que estava dependente ou muito envolvido?
- alguma vez deixou de realizar alguma atividade por ter gasto muito dinheiro com álcool ou drogas?
- muda rapidamente de muito feliz para muito triste ou de muito triste para muito feliz por causa das drogas?
- já quebrou regras ou desobedeceu a leis por estar “alto”, sob o efeito de álcool ou drogas?
- já sofreu algum acidente de carro depois do uso de alguma substância?
- alguma vez se machucou acidentalmente ou machucou alguém após o uso?
- alguma vez teve uma discussão séria ou briga com um amigo por causa do uso de álcool ou drogas?
- alguma vez teve problemas de relacionamento com algum de seus amigos?
- alguma vez teve sintomas de abstinência como tremores, náuseas, vômitos ou dores de cabeça após o uso?
- alguma vez teve problemas para lembrar o que fez enquanto estava sob efeito de drogas ou álcool?
- gosta de brincadeiras que envolvem bebidas quando vai a festas, como “vira-vira”, apostas para ver quem bebe mais rápido ou a maior quantidade, entre outras?
- tem problemas para resistir ao uso?
Se você respondeu “Sim” a algumas dessas questões, não deixe de buscar ajuda profissional.
Vale ressaltar que, especialmente no caso da dependência de álcool, os critérios estipulados pela OMS para identificar um caso de vício é muito distante do imaginário popular, no qual a pessoa vive caída pelas ruas de tanto beber. Enquadram na dependência aqueles que:
- fazem um consumo em grandes quantidades,
- bebem mais de duas doses por dia,
- não deixam de beber pelo menos dois dias da semana.
As doses equivalem a 330 ml de cerveja, 100 ml de vinho ou 30 ml de destilados.